O filme Viridiana, 1961, do Espanhol Luis Buñuel tem por mote a crítica ao cristianismo. No longa-metragem a personagem principal tenta, com autêntica boa-fé, ajudar os pobres e necessitados que, em determinado momento voltam-se contra ela e a ofendem. Um explícito ato de crueldade e ingratidão que faz por desconstruir o próprio caráter de Viridiana. A crítica do diretor enfoca, nesse momento do filme, a inutilidade do altruísmo pontual. É ineficaz tentar ajudar alguns se os valores coletivos padecem pelo descrédito e maldade inata do homem. O Bellum omnium contra omnes, guerra de todos contra todos, descrito por Hobbes em Leviatã, 1651, é explicitado no filme: o homem é mau por natureza.
Acredito que a regra universal para que o ser humano pudesse viver em harmonia foi positivada na resposta dada a um escriba por Jesus Cristo quando classificou este como o segundo e último mandamento (Marcos 12:31): Amarás ao teu próximo como a ti mesmo. Se seguíssemos essa regra seria desnecessária e mesmo inexistente qualquer reflexão sobre a essência humana e nossos conflitos. Entretanto, vejo Jesus Cristo como um bem-aventurado idealista utópico e Hobbes como um pragmático observador.
Em visão menos “pura”, mas ainda idealizadora, Kant descreve seu imperativo categórico como o dever que toda pessoa tem de agir conforme os princípios que ela quer que todos os seres humanos sigam; que ela quer que seja uma lei da natureza humana. Agir corretamente pelo simples fato de agir. Talvez esse fosse, no meu ver, o segundo degrau hierárquico na escala de normas para a vida humana harmônica. Entretanto, retornando a Hobbes, a regra mostra-se utópica para o homem
Consideradas as visões idealistas-inatingíveis de Jesus Cristo e Kant contra o descritivo pragmatismo de Hobbes, talvez, como mandamento verossímil e factível para atingir o equilíbrio, pudesse o homem comum (nós) usar como lema o mandamento hipocrático descrito 430 anos antes de Cristo quando orientou seus alunos sobre as formas de atuar: Pratique duas coisas ao lidar com as doenças; auxilie ou não prejudique o paciente. O princípio bioético da não maleficência, primum non nocere, presente no Juramento Hipocrático, pode ser a forma ideal do equilíbrio do homem que vive em sociedade, que considera valores próprios e coletivos. O simples fato de não causar dano a ninguém já seria conduta suficiente para viverem todos em sociedade justa. Entretanto, tenho medo de que Hobbes tenha sido visceral, definitivo...